Por Guilherme Lamas
Representante autêntico, Luizinho 7 Cordas é uma verdadeira enciclopédia do violão de 7 cordas, do choro e do samba. Sabe tudo sobre o acompanhamento de violão e da linguagem tradicional. Dono de um sotaque irreverente na fala e no modo de viver, transporta sua alegria e criatividade na maneira de acompanhar solistas e cantores. Luizinho é reverenciado pela tradição em sua obra, destacando mais de 1.000 arranjos e cerca de 300 gravações registradas. Suas atividades musicais vão desde compositor, arranjador, violonista e professor.
Luiz Araújo Amorim nasceu em Marília, e ainda recém-nascido, mudou-se com a família para a cidade litorânea de Santos, onde morou até 1997. Os primeiros contatos com a música vieram através de seu pai, o feirante Bráulio Araújo, que nas horas vagas se dedicava ao estudo do cavaquinho e do violão. O pai de Luizinho foi integrante do regional Estrela de Ouro, que acompanhava choros e serestas na cidade de Santos.
Atento e ansioso para ouvir e aprender o que seu pai tocava no regional, quando tinha apenas 6 anos de idade Luizinho ganhou de Seu Bráulio um cavaquinho de presente do seu pai. O violão chegou em sua vida alguns anos depois, também presenteado pelo pai. Aos 12 anos de idade e com seu violão Di Giorgio, Luizinho estudou violão erudito no Conservatório Musical Brasil, em Santos, com o professor Carvalhinho – que foi aluno de Atílio Bernardine (1888 – 1975). Este, por sua vez, foi professor de Garoto (1915 – 1955).
Além do estudo erudito, Luizinho estudava e tocava música popular. Curioso pelo som mais grave dos violões que ouvia nas emissoras de rádio e LP’s de seu pai, conheceu o violão de 7 cordas e passou a estudá-lo com o professor Maurício Moura. Com pouco tempo de aula, Luizinho passou a dominar o 7 cordas e ingressou no regional do Dadinho – famoso bandolinista da Baixada Santista. A partir daí passou a ser reconhecido profissionalmente e recebeu a alcunha de Luizinho 7 Cordas. “Minhas principais referências são Horondino José da Silva (1918 – 2006), o Dino 7 Cordas, e Maurício Moura, que morava em São Vicente (SP) e era do nível do Dino, ou mais.”
Na verdade, Dino é uma figura acima de qualquer comparação. É o professor maior do violão de 7 cordas, que nas palavras de Luizinho 7 Cordas, desde seus 13 anos já sofria influência do violão de Dino e estudava copiando as baixarias do mestre.
Um dos marcos profissionais de Luizinho ocorreu em 1977, quando tocou ao lado do pianista Arthur Moreira Lima no 1º Festival de Choro no Teatro João Caetano (RJ), realizado pela Rede Bandeirantes de Televisão, com transmissão para toda a rede nacional. Por sua memorável performance no festival, Luizinho recebeu o troféu de revelação entregue por seu ídolo, o mestre Dino 7 Cordas. Este prêmio, além de grande visibilidade, também lhe trouxe prestígio. E recebeu diversos convites para shows, gravações, produções, dentre os quais convite para trabalhos com o bandolinista carioca Déo Rian.
Apesar de tantas ofertas de trabalho no Rio de Janeiro, Luizinho optou por continuar morando em Santos, por ser muito apegado à sua mãe. Continuando assim seus trabalhos com regional do Dadinho até 1980, período em que foi convidado para integrar o regional do bandolinista Evandro, em São Paulo. A primeira gravação de Luizinho aconteceu naquele mesmo ano, no LP do compositor paulista Geraldo Filme (1927 – 1995), pela gravadora Eldorado. O álbum foi lançado em LP em 1980 e posteriormente em CD, em 2003.
Em seu papel de violão acompanhador, Luizinho 7 Cordas trabalhou com artistas como Nelson Gonçalves, Silvio Caldas, Noite Ilustrada, Cartola, Elizeth Cardoso, Clara Nunes, Beth Carvalho, Waldir Azevedo, Isaurinha Garcia, Ademilde Fonseca, entre outros.
Apoiado na trajetória tradicional do violão de 7 cordas e, ao mesmo tempo, acorado no estudo técnico e teórico que aprendeu a partir do violão clássico, Luizinho passou a escrever os arranjos e baixarias do violão 7 cordas para utilizar em shows, gravações e nas aulas que ministra. Ou seja, além da performance, ele ganhou um mercado de trabalho na década de 1980, pois era era um dos únicos violonistas de 7 cordas daquele período que sabia ler e escrever partitura. Este fato contribuiu para alavancar seus trabalhos em estúdio.
Somando o aprendizado da tradição oral com o estudo formal, a utilização das partituras na trajetória de Luizinho o ajudou em diversos momentos em que acompanhou alguns solistas com harmonias não intuitivas, como é o caso das composições do violonista Canhoto da Paraíba (1926 – 2008). Luizinho relata que:
Em 1985, aproximadamente, eu acompanhei por muito tempo o Canhoto da Paraíba em São Paulo. Ele me chamava de Miudinho, Pequenininho, alguma coisa assim. Ele ia lá em casa, a gente ensaiava pra fazer show nos teatros e em outros lugares. Aí me deu um disco e falou assim “pega o disco aqui e escreve...”, pois era mais fácil fazer partituras ouvindo pelo disco do que por ele tocando.
Luizinho escreveu cerca de 1.000 partituras, entre arranjos e transcrições, e comenta que muitas vezes os músicos conhecem mais a grafia da sua letra do que seu rosto. Tanto que numa turnê pelo Japão com Evandro do Bandolim, suas partituras já estavam sendo utilizadas por músicos japoneses antes mesmo de ele chegar lá, nas rodas de choro.
A clarinetista israelense Anat Cohen comenta que aprendeu a tocar choro reproduzindo as linhas de 7 cordas escritas por Luizinho 7 Cordas. Houve ocasiões em que, ao sentir dificuldade de entender a estrutura nas rodas de choro, Anat tocava a melodias dos choros, mas também reproduzia no clarinete os contracantos de violão 7 cordas escritos por Luizinho. Os arranjos passaram a ser parte integrante da composição e as músicas passaram a ter um diálogo entre melodia e contraponto.
As partituras de Luizinho são sempre muito bem escritas, fáceis de ler, limpas e bonitas. Um exemplo dessa característica é que o songbook Arismar foi publicado com a edição das obras manuscritas pelo violonista.
Em 1992, Luizinho foi candidato a vereador. A popularidade dele era tanta que em novembro daquele ano estava embarcando no Japão pela primeira vez, com Evandro do Bandolim, e ainda ganhou um rótulo de cachaça. “Pra nossa sorte Luizinho não foi eleito e pode continuar tocando seu instrumento e encantando a todos”. O violonista foi integrante desse regional até a morte do bandolinista, em 1994.
Luizinho concedeu diversas entrevistas ao longo da carreira. Algumas delas estão acessíveis no YouTube. Ele também é capa da 14ª edição da Revista Violão + (de outubro de 2016), que está disponível para baixar grátis no site do Acervo. Sua obra também é estudada em trabalhos acadêmicos, a exemplo do TCC de graduação Luizinho 7 Cordas e sua contribuição para o Choro, defendido por Silvio Pereira Lopes Neto, na Unisantos, em 2022.
No segmento audiovisual, em 2015 Luizinho participou do quarto episódio da série documental Sete Vidas em 7 Cordas, apresentado por Yamandu Costa, com direção de Pablo Francischelli e lançado no Canal Brasil.
Luizinho tem recebido homenagens, a exemplo da Escola de Choro e Cidadania Luizinho 7 Cordas, criada em 2011 pelo Clube de Choro de Santos, em parceria com a Prefeitura Municipal. O lema da instituição é o aprendizado da música a partir do choro, patrimônio imaterial brasileiro.
Para conhecer um pouco mais do material sonoro de Luizinho, destacamos as gravações:
2010: grupo Roda de Choro Ao Vivo
Chorinho pra você – no Sesc Instrumental
https://www.youtube.com/watch?v=c5NGOcNyF4g
2013:
Sempre Acesa – com Beth Carvalho e Quinteto em Branco e Preto
https://www.youtube.com/watch?v=9BjPw-hOL5s
2015: Quarteto Roda de Choro Estúdio
Roda de Choro – composição de Luizinho 7 Cordas
https://www.youtube.com/watch?v=oz9Ilmnk88M&list=OLAK5uy_mOLnjZtnCD699sxpJm9Q8yNJ453BYHeTw&index=4
- participações nos programas de TV:
2002: no Programa Ensaio da TV Cultura:
Quem há de dizer – com Noite Ilustrada
https://www.youtube.com/watch?v=irGeNXVdRx4
2013: no Sr Brasil da TV Cultura:
Santo Expedito – com Chapinha da Vela
https://www.youtube.com/watch?v=wP740ELnyLs
2018: no Brasil toca choro da TV Cultura:
Sons de Carrilhões – com Alessandro Penezzi
https://www.youtube.com/watch?v=9RUO1E5AS0M
Outra interpretação emblemática de Luizinho é uma gravação ao vivo, acompanhando o Joãozinho do Bandolim, em que, ao finalizar a música, ele diz um sincero “Isso é choro!”
2008: gravação caseira
Dolente – Jacob do Bandolim
https://www.youtube.com/watch?v=7FE5msnKfKc
Trago neste verbete uma transcrição que fiz do improviso de Luizinho 7 Cordas na parte A do choro Cochichando, de Pixinguinha, interpretado pelo grupo homônimo em 2008.
2008: Cochichando com o grupo Cochichando
https://www.youtube.com/watch?v=iI4eGhwvloA&t=35s
(instante 0:00 até 0:35)
Trago também a seguir a composição Choro de todos os Santos, reelaboração que fiz a partir da obra de Luizinho 7 Cordas; partitura e áudio:
2022: Choro de todos os Santos – composição de Guilherme Lamas
https://www.youtube.com/watch?v=u4DZxajpR2Q
Luizinho foi casado com Neusa Lima Amorim e é pai de André Amorim, Adriano Amorim, Kamila Souza Lima e Caroline Souza Lima. Os homens seguiram a carreira do pai: André é cavaquinista e Adriano, bandolinista.
Discografia
Quantidade de gravações: 300 aproximadamente
LP 1980 / CD 2003 Geraldo Filme
1985 / 2005 Preto no Branco – Osvaldinho da Cuíca
LP 1986 “E o choro continua...” Evandro do Bandolim e seu regional
1999 Canções Paulistanas – Trovadores urbanos cantam Adoniran Barbosa
2000 Riqueza do Brasil – Quinteto em branco e preto
2001 Na Chama do Choro – Armandinho do Cavaco
2002 Tributo à Nabor Pires de Camargo
2003 Sentido popular – Quinteto em branco e preto
2004 Sentido – Flávia Bittencourt
2005 Alagoas em trilogia; da lagoa pro mar, do mar pra lagoa – Fernando Melo
2005 Choros inéditos – Aleh Ferreira
2005 Filosofando – Marquinho Mendonça
2005 Perambulando – Danilo Brito
2006 Osvaldinho da Cuíca convida em reverência ao samba paulista – Osvaldinho da Cuíca
2006 Alessandro Penezzi
2006 Chorando as Pitangas – Vitor Lopes
2006 Direito de Sambar – Adriana Moreira canta Batatinha
2007 Beth Carvalho canta o samba da Bahia ao vivo
2008 Sem restrições – Danilo Brito
2008 Na gafieira – Thiago França
2010 Panorama do Choro Paulista Contemporâneo
2013 O glorioso retorno de quem nunca esteve aqui – Emicida
2014 Tributo a Mario Alvares CD 1, 2 e 3 – Agnaldo Luz, Gustavo Cândido e Ricardo Cassis
2016 Trios – Ricardo Valverde
2022 Duetos – Gilberto Gil
- Sendo apenas 4 lançado com seu nome:
2006 Remexendo Euclides Marques e Luizinho 7 Cordas
2010 Danilo Brito e Luizinho 7 Cordas – 50 anos de música
2013 Quarteto Roda de Choro
2014 Homenagem a Toco Preto – Luizinho 7 Cordas e Agnaldo Luz
2021 Almanach do Choro – Luizinho 7 Cordas e convidados
Referência
GONÇALVES Marcello. Literatura para o violão de 7 cordas brasileiro solista. Tese (Doutorado em Música). UFRJ, Rio de Janeiro, 2019.
LAMAS, Guilherme. Site didático sobre transcrições e análises melódicas para o violão de sete cordas no choro e no samba. TCC de Graduação, IPEP, 2008.
LAMAS, Guilherme. O violão de sete cordas dos irmãos, Valter Silva e Valdir Silva. (Mestrado em Música). UNICAMP, Campinas, 2018.
NETO, Silvio Pereira Lopes. Luizinho 7 Cordas e sua contribuição para o Choro. TCC de Graduação, UNISANTOS, 2022.
Sites
http://www.choroecidadania.org.br/
https://ims.com.br/convida/luizinho-7-cordas/, acesso em 11/04/2024.
https://www.instagram.com/luizinho7cordas/, acesso em 11/04/2024.
KFOURI, 2024, Maria Luiza. Site www.discosdobrasil.com.br, acesso em 11/abril/2024.
PRUKS, Christian. Entrevista: Luizinho 7 Cordas, violonista
https://clubedoaudio.com.br/edicao-253/entrevista-luizinho-7-cordas-violonista/, acesso em 11/04/2024.