Partituras esquecidas de José Augusto de Freitas são lançadas em livro histórico
Por Alessandro Soares
Desde quando criei o Acervo Digital do Violão Brasileiro há 10 anos, fiquei chocado com a grande quantidade de personagens importantes da nossa história, mas que morreram esquecidos. O mineiro José Augusto de Freitas (1909-1990) é um deles. Meu parceiro de pesquisas Jorge Mello (autor de inúmeros textos aqui publicados) foi quem indicou e escreveu o verbete biográfico dele, especialmente para nosso Dicionário. E ainda decidimos publicar a partitura da peça Gavota, originalmente lançada na revista O Violão.
Mas agora Jorge resolveu aprontar uma daquelas boas, desta vez ao lado do violonista e pesquisador Celso Faria. Ambos escreveram a biografia José Augusto de Freitas: elo perdido do violão brasileiro, em tiragem limitada e de forma independente. E não pararam. Desta vez a dupla se junta ao editor Ivan Paschoito (da Legato) para lançar este é que o primeiro álbum de partituras do compositor, que se chama José Augusto de Freitas: 10 obras originais para violão.
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Em tiragem bem limitada e sem patrocínio algum, o livro tem 48 páginas e reúne partituras que estavam completamente esquecidas e engavetadas, aos cuidados da família de Freitas. Entre elas Prelúdio, Fantasia, Allegro Sinfônico, Cachorro Quente, Saudade, Lamentos d'alma e Dança Árabe.
Apenas três músicas já haviam sido publicadas anteriormente, incluindo a já citada Gavota, Eurídice e Soluços (considerado o único sucesso de Freitas, por ter sido gravada por Dilermando Reis). Há ainda duas partituras como bônus: a valsa Prantos, escrita por Edmar Fenício em homenagem a José Augusto de Freitas, e a Seresta nº 3, composta por Sylvio Serpa Costa (ex-aluno e parceiro musical de Freitas).
O livro tem apoio cultural do Acervo Violão Brasileiro, que tem a exclusividade na pré-venda. Quem quiser garantir seu exemplar, basta clicar na nossa loja. As entregas começarão a ser feitas a partir da próxima terça-feira (12 de novembro).
(Jorge Mello e Celso Faria)
Além da revisão e dedilhado das partituras, Celso Faria faz uma breve e valiosa análise das obras, enquanto Jorge Mello escreve a biografia resumida do compositor. Há também a rica apresentação assinada por Fabio Zanon. “O trabalho de Jorge Mello e Celso Faria sobre José Augusto de Freitas, além de lançar finalmente uma luz sobre o excelente violonista, compositor e professor, nos traz o retrato de uma época, de um cenário artístico com sua potência, suas virtudes e seus vícios. Este trabalho minucioso de pesquisa e interpretação das fontes primárias contribui para dissipar percepções errôneas, tingidas pelo disse-me-disse”, afirma.
Zanon também destaca no texto que Freitas operou num ambiente fortemente informado pela diferença de classe, em que um concerto que incluísse exclusivamente obras clássicas era automaticamente canonizado, enquanto aquele que olhasse para a música popular tendia a ser alvo de críticas mais pontiagudas. “Porém é também um ambiente em que a vocação ecumênica do violão, ao transitar entre o repertório herdado de Tarrega e solos da tradição recente do choro e da música de salão, já se manifesta”.
Ainda segundo Fabio Zano, “Freitas emerge como um fascinante personagem de transição entre uma fase dos primeiros concertistas brasileiros, que não tinham sequer uma ideia muito clara do que era o violão de concerto até à chegada de Barrios e Robledo, mas que, nessa singela ignorância, contribuíram para uma linguagem especificamente brasileira de violão, e aquela geração que já se beneficiou de uma educação musical mais formalizada, pós-conservatório, e teve a oportunidade de optar pela carreira acadêmica, graças a Isaías Savio e ao aluno de Freitas, Jodacil Damaeno, ou ocupar um espaço internacional como Turíbio Santos e Barbosa Lima”.
(Fabio Zanon - Crédito: Elisa Gaivota)
Pois é justamente esse personagem tão esquecido da memória nacional, mas que brilhou no violão entre os anos 1920 e 1940, que Jorge e Celso revela com uma pesquisa tão bem realizada.
Sobre a sua biografia, Jorge Mello mostra o quanto Quincas Laranjeiras considerava Freitas o seu aluno mais promissor. “Em 1928, junto com Rogério Guimarães e Lourival Montenegro, José Augusto acompanhou João Pernambuco e seu violão em várias apresentações na Rádio Sociedade do Rio de Janeiro”.
Jorge também desfila uma saborosa série de recitais de Freitas. “Em 1930, José Augusto realizou três concertos: em 18 de janeiro, na sede do Tijuca Tênis Clube (Rio de Janeiro–RJ) — o sucesso retumbante desta apresentação lhe abriu as portas para participar da programação social e artística daquela casa que, tempos depois, daria origem à Radio Cajuti; no dia 21 de março, no Clube das Fontes (Lambari–MG) e, em 10 de julho, no Teatro Fênix (Rio de janei- ro–RJ) — no repertório desta apresentação, além de peças de Albeniz, Tárrega, Tolsa, Barrios, Bach e Beethoven, ele incluiu o Choros no 1, de Villa-Lo- bos. Este concerto teve enorme repercussão, inclu- sive internacional, através de matéria publicada na prestigiosa revista Musica, de Barcelona, Espanha”.
(José Augusto de Freitas)
E reconstitui o encontro de Andrés Segovia – quando veio ao Brasil pela primeira vez, em 1937 – e José Augusto de Freitas, que lhe presenteou com uma de suas composições, o Allegro Sinfônico. “Este contato certamente o estimulou a retomar seus concertos. Em 8 de setembro de 1937, José Augusto apresentou-se na Escola Nacional de Música com novidades no seu repertório, passando a incluir obras de Othon Salleiro, Henrique Brito e Isaias Sávio e, claro, músicas de sua lavra”.
Apesar dessa grande trajetória artística, José Augusto de Freitas morreu em 24 de agosto de 1990, completamente esquecido.