Morre o violonista e professor carioca Leo Soares
(Leo Soares)
Por Alessandro Soares e Geovany Hércules
As lembranças da generosidade e do bom humor, somado à excelência como virtuose solista e professor inspirado são constantes quando se fala no violonista e professor carioca Leo Soares (1943-2024), que morreu na quarta-feira (10/07) à noite, de falência múltipla dos órgãos. O velório foi realizado nesta sexta-feira (12/07), no Memorial do Carmo, seguido da cremação. Um dos maiores representantes do violão no Rio de Janeiro, Leo foi um grande formador de violonistas por várias gerações. Nomes como Nicolas de Souza Barros, Maria Haro, Marcelo Kayath, Paulo Pedrassoli, Luis Carlos Barbieri, Bartolomeu Wiese, Zé Paulo Becker, Paulo Aragão e Marcus Tardelli esturam com o mestre.
Em tributo a Leo Soares, o Acervo Violão Brasileiro está publicando diversos artigos afetuosos de destacados ex-alunos e amigos na seção Cartas de Amor, deste Blog. O luthier e escritor Ricardo Dias, o professor e violonista de 7 cordas Luiz Otávio Braga, além do próprio diretor da AV-Rio, Nicolas de Souza Barros, são alguns dos que assinam os textos. O compositor e artista plástico Roberto Velasco escreveu uma partitura ontem dedicada a Leo e que o Acervo publicará brevemente.
(Leo Soares durante masterclass)
Nascido em 18 de outubro de 1943, Leo Affonso de Moraes Soares iniciou os estudos na música aos três anos de idade com a professora de violino Helena Polac, da Escola Vienense de Música e se dedicou ao instrumento até os 13 anos. Somente aos 15, ele passou a se dedicar ao violão, sob orientação de Jodacil Damaceno. Posteriormente teve aulas com mestres, como Oscar Cáceres, Jorge Martínez Zárate e Narciso Yepes.
Sua carreira docente começou nos anos 1960. Em 1964, tornou-se professor dos Seminários de Música Pro Arte, onde atuou por 26 anos. Também foi professor do Conservatório Brasileiro de Música do Rio de Janeiro, assim como da Escola Villa-Lobos. Estruturou o Curso Superior do Conservatório de Música do Espírito Santo e foi convidado para inaugurar o Curso Superior de Violão da Universidade Federal do Pará, além de ministrar o Curso de Atualização dos Professores de Violão do Conservatório de Música de Pernambuco.
Ao longo da trajetória, ministrou inúmeras masterclasses em cursos e festivais de música em diferentes cidades do país, a exemplo de Ouro Preto, Porto Alegre, Teresópolis, Ribeirão Preto e São Paulo. E também no Conservatório de Música e Centro Cultural Brasil/Bolívia em La Paz e no Centro Cultural Brasil/Peru em Lima.
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O solista
Como concertista, Leo Soares realizou turnês pela Argentina, Peru e Bolívia, em praticamente todas as principais cidades desses países, além das principais capitais brasileiras. Entre 1968 e 2000, realizou apresentações solo, camerísticas e com orquestra. Em algumas ocasiões, apresentou obras como a Fantasia Concertante, de Heitor Villa-Lobos, o Concierto de Aranjuez, de Joaquin Rodrigo e De Eleonor Rigby a Penny Lane, do cubano Leo Brouwer (sobre temas dos Beatles).
Sua carreira se dividiu entre as funções de intérprete, didata e cargos administrativos exercidos na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Foi Vice-Diretor e Diretor da Escola de Música desta instituição, assim como Diretor Adjunto do Curso de Graduação do Centro de Letras e Artes, onde se aposentou em 2012 como Decano.
(Leo Soares sendo homenageado na AV Rio. Em pé começando pelo lado esquerdo: Filipe Freire/ Augusto Cézar Cornélius/ Chuang You Ting / Maria Haro / Paulo Aragão/ Ricardo Dias / Luis Carlos Barbieri/ Adriana Balleste/ Marcos Farina. Sentados ou ajoelhados, começando pelo lado esquerdo: Desconhecido / Léo Soares / Fábio Adour/ Nicolas de Souza Barros)
Segundo o ex-aluno, violonista e professor, Nicolas de Souza Barros, em artigo publicado aqui no Blog do Acervo, Leo Soares é um formador de gerações de violonistas. E destaca o recital que a Associação de Violão do Rio (AV Rio) realizou em 2023 para homenagear os 80 anos do mestre. “Neste recital, vem primeiro os dinossauros (década de 1970), como eu e Marcos Farina. Depois seguem os alunos da década de 1980, que nem Maria Haro, Paulo Pedrassoli, Luis Carlos Barbieri e Bartolomeu Wiese. Na década de 1990, temos Zé Paulo Becker, Paulo Aragão, o Quarteto Maogani e Marcus Tardelli. E na década de 2000, Vinícius Perez”, enumera.
Repercussão
Muitos ex-alunos se manifestaram sobre a morte de Leo Soares.
Zé Paulo Becker - “Conheci o Leo no curso da Pro Arte de Terezópolis em janeiro de 1984. Era um festival maravilhoso. Os alunos ficavam hospedados lá por um mês, fazendo aulas, vendo concertos, enfim... música 24 horas por dia. Leo fazia uma maratona de técnica todos os dias, das 8h às 10h da manhã. Depois, masterclass até meio-dia. Às tardes eram livres para estudos e ensaios. A partir dali fui estudar com ele na Pro Arte do Rio, na Rua Alice. Estudei até ingressar na faculdade. Foi um grande mestre do violão clássico. Primeiro como professor particular e depois na UFRJ. Sempre muito bem-humorado com ótimas histórias. Leo partiu deixando sem dúvida um legado no ensino do violão no Brasil. Vai em paz Leo, meus sentimentos à família”
Paulo Aragão - “Leo foi uma pessoa importante no início da minha formação musical. Convivi bastante com ele nos anos 90, tinha 14 anos quando comecei a ter aulas na casa dele, e depois segui como seu aluno no Bacharelado em Violão na UFRJ. Sempre gostei de fazer arranjos e transcrições para violão, e no meu concerto de formatura incluí vários desses números, não muito convencionais - e o Leo sempre apoiou essas iniciativas. A lembrança que fica é de um cara sempre muito bem-humorado e generoso. Foi realmente um nome muito importante nessa geração que estabeleceu o estudo do violão no Rio de Janeiro”.
Mario da Silva - “Leo me ensinou muita coisa desde Bach a Brouwer. Muito perspicaz em suas análises. Numa das bancas do Concurso ele esteve aqui em casa. Muito gentil e bem humorado. Meus sentimentos a família. Deixa um legado ao violão”.
Ricardo Dias – em seu texto de despedida publicado no site do Instituto Memória Musical Brasileira, Ricardo Dias não polpa elogios e chama Leo de um dos maiores professores de violão de nossa história. Segundo Dias, Leo Soares era “um violonista ágil, virtuoso, inconfundível. Ouvi-lo uma vez era não esquecer mais. E ser seu aluno era sempre lembrar de sua frase famosa, ‘estudando, sai’. E que no fim das contas resolve: de fato, estudando tudo sai”.
Marcelo Kayath – “Comecei a estudar com o Professor Leo Soares no final dos anos 70 na Pro-Arte do Rio de Janeiro. Minha aula sempre acontecia às sextas no final da tarde. Naquela época, a Pro-Arte era um centro de excelência de educação musical, a gente respirava música assim que entrava pela porta. Eu sempre chegava pelo menos três horas antes da minha aula com o Leo, porque assim tinha chance de participar de alguma coisa que estivesse acontecendo ali na hora. Dei sorte muitas vezes, adquirindo conhecimentos musicais inestimáveis de professores como Homero Magalhães, Norton Morozowicz e muitos outros. No entanto, a coisa mais importante do meu dia era realmente a aula com o Leo.” (este trecho foi extraído do artigo de Ricardo para o Immub) e merece ser lido na íntegra aqui).
(Leo Soares)
Sem dúvida, a partida de Leo Soares é uma grande perda para o violão brasileiro. Mas o seu legado profissional e pessoal sempre será lembrado por todos aqueles que foram tocados pelo seu ensino, carisma e talento.