Live revela trajetória de Sérgio Belluco, que mudou a história do violão em Piracicaba
(Sérgio Belluco e Alessandro Penezzi - crédito: )
Por Alessandro SoaresA história do violão clássico em Piracicaba, no interior paulista, divide-se entre antes e depois de Sérgio Belluco. Aos 94 anos de idade, ele tem muito a revelar, seja como compositor, intérprete, pesquisador e professor. A trajetória artística e pedagógica desse grande mestre será revelada nesta terça-feira (24/09), às 19h, durante a live que será transmitida pelo Youtube do Acervo Violão Brasileiro.
Quem participa do bate-papo ao vivo são seus ex-alunos Alessandro Penezzi, Gustavo Penna, Raíssa Amaral e Saulo Ligo, além do próprio Belluco. Vamos mostrar um pouco do manancial de fitas de rolo que ele gravou ao longo da vida. Tem também 1,2 mil partituras manuscritas em caligrafia caprichada - grande parte são de arranjos criados por ele, reunidas em 43 cadernos. Um trabalho hercúleo feito por uma só pessoa. E ainda um panorama das 80 peças que compôs. Raíssa conseguu preservar boa parte do acervo de Belluco. O mestre é tema de mestrado feito por Saulo e agora Penezzi fará dissertação sobre o ídolo. Será emocionante!
Esta live faz parte do Projeto Contos e Cantos do Violão em São Paulo, que foi contemplado pelo ProAc Edital 15/2023 e marca o aniversário de 10 anos do Acervo Digital do Violão Brasileiro, criado por Alessandro Soares, que fará a mediação da live, junto com o violonista e produtor Thiago Abdalla.
Com o título, Sérgio Belluco: arquivo musical, trajetória violonística e obra, a dissertação feita por Saulo Ligo mostra o quanto o arquivo pessoal de Belluco representa um repositório violonístico impressionante e fonte de outras informações musicológicas. São documentos raros que ajudaram a dinamizar as práticas musicais na região. Num segundo momento foi trabalhada a trajetória artística, destacando o repertório violinístico praticado por Belluco e seus alunos, entendendo-o como propulsor de uma cultura violonística local.
Em depoimento ao Acervo, Alessandro Penezzi conta que foi aluno de Sérgio Beluco dos 11 aos 25 de idade, aproximadamente. "Ele foi meu maior professor de todos os tempos, assim como de muitos músicos de Piracicaba. Quando ele estava na ativa, nós costumávamos dizer que quem não foi aluno do Sérgio Beluco foi aluno dos alunos dele".
Belluco foi o mais importante professor de violão clássico de Piracaba e o grande divulgador também do choro, segundo Penezzi. "Antes dele havia, obviamente, músicos chorões, de forma dispersa. Mas a grande figura mesmo foi o Belluco. Ele transcreu, por conta própria muitos cadernos enorme com melodias do choro, numa caligrafia maravilhosa. Tem cópia desse material na Universidade Indiana, pois o professor Marquito Cavalcante levou pra lá", destava Penezzi.
Como compositor, Sérgio Beluco escreveu mais de 80 obras, entre choros, valsas, polcas, mazurcas, tangos. Isso tanto em formato melodia e cifra, quanto peças para violão solo (dessas ele escrever cerca de 25), entre as quais tem as valsas serestas, que Penezzi gravou algumas. As valsas são também tema do mestrado que Penezzi está fazendo um trabalho de mestrado sobre a valsa seresta número 3, pela UFBA, sob orientação do professor Mario Ulloa.
Sérgio Belucco também foi grande arranjador. "Ele teve, por muitos anos, um conjunto chamado Conjunto Serenata, que era especializado em tocar músicas de seresta, mas também choros. E era um conjunto que fazia músicas solos, músicas instrumentais, mas que também acompanhava os cantores seresteiros da época. Eu cheguei a participar, há algum tempo, desse conjunto tocando cavaquinho e, às vezes, bandolim".
O conjunto tinha a seguinte formação: uma flauta, um clarinete, dois violinos e violão. Algumas vezes entravam mais músicos. "O lado do Belluco arranjador funcionava assim. Eu lembro de oito jogos de cadernos. Cada caderno com oitenta músicas, e cada instrumento tinha o seu próprio caderno. Havia oito cadernos de flauta, oito cadernos de clarinete, de violino um e de violino dois, e esses arranjos eram feitos pelo professor Sérgio. Eu nunca fiz essa conta, mas seria cada caderno com oitenta músicas. Tinha oito cadernos, são 560 músicas, mais ou menos. Isso tudo arranjado por ele. Então, imagina, é um trabalho hercúleo. E sempre soava muito bonito, porque era muito baseado nos arranjos do Regional do Canhoto, do Regional do Alberto Strada, Que eram músicas de serestra, muito líricas, muito bonitas", recorda Penezzi.
Saulo Ligo enumera que o Sexteto Piracicabano, o Conjunto Serenata e o Som Brasileiro são alguns dos grupos que Belluco integrou. E desde os anos 1940 foi montando um invejável arquivo pessoal de fitas magnéticas e variados documentos que viraram valiosas fontes musicológicas. "Em várias frentes ele tem uma importância muito grande. Como compositor, Belluco avalia que suas obras têm um caráter semiclássico. E como intérprete de violão clássico ele sentiu falta de se apresentar mais vezes, de ser mais reconhecido. Mas no geral ele uma produção muito vasta".
Em sua dissertação, Saulo Ligo destaca na conclusã que o arquivo que Belluco produziu serviu como espelho para a própria obra e vice- versa. "Uma relação dialética, onde a carreira artística de um catalisador do estudo do violão para a região de Piracicaba foi influenciada pelo próprio arquivo e sua constituição (que se expandiu, na medida em que o artista se desenvolveu."
O papel de intermediador cultural é bem marcante. Em paralelo aos conjuntos musicais que criou e para quem faz centenas de arranjos, Belluco transitou por espaços distintos, circulando as informações violonísticas e agenciando um movimento em torno da cultura musical, onde o violão cumpriu seu papel de destaque, resume Saulo Ligo em sua pesquisa.
Com relação às aulas, o professor Sérgio Beluco sempre foi muito meticuloso com os alunos dele. Era um professor muito exigente, então ele baseava as aulas dele nos livros La Escuela de la Guitarra, do Mário Rodrigues Arenas, (que é um compendio, um compilado de muito valor da Escola do Aguado, do Antônio Carulli, o Fernando Sor, Napoleão Costa, o Carcassi. Então, é um compilado com tudo isso, separado em níveis. Eram sete livros. Cada livro feito, o aluno fazia, levava um ano mais ou menos para terminar cada livro. só para seguir adiante quem realmente vencesse as lições.
(Gustavo Penna)