Entrevista inédita e fotos raras do violonista e professor Henrique Pinto são publicadas pelo Acervo
(Henrique Pinto / Arquivo particular: Shirley Higa)
Por Flávio Apro*
O Acervo publica com exclusividade nesta sexta-feira (04/12) uma antiga entrevista com o grande professor Henrique Pinto (1941-2010). Era outubro de 1999 quando o violonista Flávio Apro (atualmente professor da Universidade de Maringá), visitou Henrique no apartamento onde morava, na Vila Mariana, em São Paulo. Para ilustrar a página, contamos com fotos raras cedidas pela produtora Shirley Higa. A força das palavras de Henrique evidencia porque ele é considerado entre os mais importantes e influentes didatas do violão, tendo formado várias gerações de concertistas vencedores de concursos internacionais, além de agitador de eventos sobre o instrumento e autor de métodos de muito sucesso. Ao longo da conversa, o mestre relembra os primeiros professores da infância. Destaca o fortíssimo impacto que teve ao participar dos festivais de Porto Alegre, nos anos 1970. Comenta sobre Abel Carlevaro. “Grande músico e pesquisador. Como ele encarava a mão esquerda? Através da compreensão dos movimentos musculares. Tudo sempre aliado a muita economia de movimentos e relaxamento. O problema é que ao estudar com ele, você passa a ser um carlevariano. E nisso, há um empobrecimento”. Questionado se o concurso premia a real competência do intérprete, Henrique afirmou: “ Se perguntarmos a um júri como um vencedor foi avaliado e eles disserem que foi pela musicalidade, isso não significa nada. Esse conceito é subjetivo. Num concurso, é preciso avaliar os candidatos pelo trabalho, pelo preparo, pela precisão, pelo controle e pelo domínio de sua apresentação". Henrique tem opiniões enfáticas também a respeito das dificuldades em se realizar concertos e gravar discos. “A maioria dos violonistas não vai aos concertos de seus colegas. Só quando se trata de algum artista consagrado”. Ou quando diz que existe uma quantidade astronômica de estudantes de violão mas que eles não compram discos de violão. Prevista para sair na extinta revista Cover Guitarra, a entrevistou terminou ficando engavetada até hoje. A seguir, eis a entrevista concedida a Flávio Apro e fotos cedidas por Shirley Higa.
(Henrique Pinto / Arquivo particular: Shirley Higa)
Flávio Apro - Como foi teu primeiro contato com a música e com o violão?
Henrique Pinto: De forma aleatória. Desde pequeno, eu costumava ligar o rádio e ouvir sinfonias clássicas e música popular de bom nível. Aos nove anos, na fazenda de um tio, conheci um funcionário dele, um peão, que trabalhava de dia na roça e à noite tocava violão. Vê-lo tocar, fazer acordes ou um pequeno solo, era simplesmente fantástico. Foi ele quem me ensinou os primeiros acordes.
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Quais foram seus professores e o que você diria de especial sobre eles?
Comecei com um desses professores que a gente procura o mais perto de casa e o mais em conta possível. Ele ensinava de tudo, de violão a bateria, de violino a acordeom. Na verdade, ele entendia um pouco de violino e violão, apesar das cordas de aço. Com ele estudei o Método de Violão de Matteo Carcassi. E, em poucos meses, passei por todo o método, mesmo com as cordas de aço (risos). Tive as primeiras aulas de violão - de verdade - no Conservatório Villa-Lobos, onde estudei com o professor Sérgio Scarpiello. Ele me ensinou como sentar, empunhar o violão, colocá-lo na perna esquerda, o posicionamento da mão direita, etc. Estudei com ele por dois anos e, após sua saída do Conservatório, fui convidado a estudar com Manoel São Marcos, com bolsa de estudos. Foi uma boa experiência. Após ter servido ao exército, estudei com Isaías Sávio, uma pessoa extremamente carismática, o maior professor de violão daquela época, que já era um mito. Ele me chamava atenção pela força, energia e paixão pelo violão. Ele devia dar umas 70 aulas por semana e dormia cerca de três horas. Cheguei, inclusive, a tocar em seu Jubileu de Ouro, ao lado de grandes celebridades. Em suas aulas, ele conversava muito, e só pelo contato com ele a gente saia com uma vontade enorme de estudar violão. Ele conseguia transmitir essa energia. Por volta de 1970, fui ter aulas com Carlos Barbosa Lima. Ele era muito jovem e fiquei um ano com ele. Era uma pessoa muito boa, conversávamos muito, e fiquei conhecendo o instrumento maravilhoso que ele tinha, um José Ramirez, que cheguei a ter, mais tarde. Depois, ganhei uma bolsa para estudar em Santiago de Compostella, com o assistente de Segovia, José Thomaz. Foi ótimo, não só pelas aulas, mas principalmente pelo contato com músicos do mundo inteiro. Havia gente da Grécia, Finlândia, Japão. Quando voltei, fiquei sabendo de um festival de violão em Porto Alegre, o maior da América do Sul, com a presença de Abel Carlevaro e Guido Santórsola. Carlevaro é uma grande figura e um ser humano maravilhoso. Foi quem reorganizou minha técnica, colocou nomes e me ensinou o porquê de sentar de tal jeito, a razão pela qual a mão esquerda funciona assim e assado, os ângulos de ataque da mão direita e seus recuos, etc. Nesse mesmo festival, estudei com Santórsola, que me ensinou harmonia, análise e interpretação. Ele não tocava violão mas nos regia. Mais tarde fiz uma revisão de harmonia e contraponto com Mário Ficarelli, uma pessoa muito prática, honesta, direta, exigente, além de profundo conhecedor de música. Considero que foi um bom fechamento desse ciclo de aprendizado.
(Henrique Pinto / Arquivo particular: Shirley Higa)
Você pretende organizar o seu próprio Jubileu de Ouro?
(Rsrs) Comecei minha carreira em 1967 e estou com 58 anos, logo poderei organizar meu Jubileu como violonista. Por que não?
Fazendo uma retrospectiva de sua carreira, quais foram os momentos de maior dificuldade e que obstáculos enfrentou?
O mais difícil foi quando comecei, pois não havia referências. O que era o violão naquele tempo? Com quem estudar? Levei anos até tomar o rumo certo. Mas uma coisa interessante é que tudo foi acontecendo de acordo com minhas necessidades. Os momentos mais complicados eram aqueles em que sentia que um professor havia se esgotado. Mesmo sabendo disso, não havia saídas para aprender mais. Outro momento foi quando comecei a dar aulas, pois não havia alunos nem escolas para lecionar. Eu não trabalhei com música a vida inteira. Cheguei a ser office-boy e depois bancário. No momento em que decidi ser músico, a figura mais importante foi meu pai. Eu tinha dúvidas e ele me disse para largar o trabalho, terminar o colégio e tentar viver de violão. Outra atitude importante dele foi me levar à fábrica Di Giorgio e ter gasto todo seu salário para comprar o melhor violão pra mim. Meu pai foi tão importante quanto aqueles professores que mencionei. Às vezes, um empurrão, um estímulo, uma palavra são muito mais importantes do que a técnica em si.
Como nasceu a ideia dos seus trabalhos didáticos?
Quando resolvi me profissionalizar, comecei a lecionar e a ter muitos alunos, pois só eu dava aulas no bairro onde morava, na Mooca. Na época, usava-se o método de Sávio, mas eu me cansava de repeti-lo e passei a utilizar todos os livros editados para violão, como o São Marcos, Sagreras, Arenas, Mascarenhas, etc. Mas todos chegavam a um ponto em que era preciso passar a outro. Também foi importante o fato de que o repertório desses métodos, muitas vezes, apresentavam coisas tecnicamente antipáticas, ou uma linguagem musical que os alunos não compreendiam. A partir dessa constatação, comecei a rabiscar algumas ideias e a fazer um compilado. Foi então que a editora Ricordi me procurou, dizendo que Sávio estava muito doente e que eles precisavam de outra pessoa. Eu era o professor que mais organizava eventos aqui em São Paulo e o meu nome estava em evidência. Perguntaram-me se eu tinha algo pronto e eu apresentei Técnica da Mão Direita, um trabalho modesto que eu utilizava com meus alunos. Creio que ainda irei melhorá-lo, revisar certas falhas. O livro teve uma grande vendagem, fator muito importante para uma editora, mais importante que o mérito em si. Depois, tive a ideia do Iniciação ao Violão. Este trabalho acabou sendo o livro que mais vende na Ricordi até hoje. Fico admirado ao vê-lo em qualquer lugar em que eu vou dar aulas, o que para mim é motivo de orgulho.
(Henrique Pinto / Arquivo particular: Shirley Higa)
Um de seus livros, Ciranda das 6 Cordas, dirigido ao público infantil, está editado na Europa. Em sua opinião, qual o seu diferencial?
Fazer um livro para crianças é muito mais complicado do que para adultos. Acho que o diferencial de toda minha obra didática é que ela é um resumo da minha experiência como professor. Ao passar por todos os métodos, com um grande número de alunos, percebi até que ponto serve um método. Às vezes, eles são prolixos, com um repertório imenso, mas sem explicações básicas. Por isso, me preocupei em montar meus livros com explicações preliminares, nas quais apresento minha visão pedagógica e princípios básicos. Em cima disso, monto exercícios e pequenas músicas, que resultam numa funcionalidade. Adianto que agora em dezembro vai sair o Iniciação ao Violão vol. 2, para o qual pesquisei bastante repertório e abordo novos conceitos.
Como você avalia o nível dos violonistas brasileiros da atualidade?
Desde o ano passado (1998) tenho ido aos festivais de Portugal e assistido a concertos de grandes violonistas internacionais. Se formos discutir, hoje, o nível técnico e musical dos nossos violonistas, posso afirmar com toda tranquilidade que não devemos nada a ninguém.
Você acha que contribuiu para esse alto nível? Afinal, de uma forma ou outra, a maioria deles passou pelas suas mãos.
Acho que sim. Uma coisa importante que tentei passar a eles foi minha experiência de vida, que se resume à ideia de que para estudar violão, tem de ser músico. Há a parte técnica, mas além disso, é preciso conhecer harmonia, contraponto, história da música, repertório. Isso propicia solidez. E esse foi o fator mais importante que consegui passar para toda uma geração de violonistas que estudaram comigo.
Você poderia fazer uma avaliação da sua técnica em relação a outras, como a de Carlevaro?
Quando as pessoas procuram Carlevaro, geralmente elas encaram técnica como uma coisa distorcida do legado de Francisco Tárrega. Tárrega era uma pessoa inteligente, que sabia onde queria chegar e esse legado é um conjunto de coisas complicadas de se entender ao que leva. Por isso, se compreendeu apenas uma parte muito pobre dessa escola, ou seja, uma colocação de mão direita baseada nas fotos de Tárrega e a repetição aleatória de uma mesma escala, arpejo ou ligado. Eu vim desse tipo de escola e quando chegava a hora de tocar em público surgia um medo horroroso de esquecer, com o agravante do nervosismo. Isso porque essa escola prevê apenas a prática exaustiva de um exercício muscular, sem pensar em música. Já Carlevaro, grande músico e pesquisador, tinha muitas dificuldades e tentou resolvê-las. Através desse processo de auto-resolução, ele criou uma escola. Como ele encarava a mão esquerda? Através da compreensão dos movimentos musculares. Tudo sempre aliado a muita economia de movimentos e relaxamento. Você passa a ter um panorama geral de como funciona seu físico, a partir de princípios lógicos. O problema é que ao estudar com ele, você passa a ser um carlevariano. E nisso, há um empobrecimento. O que eu concebo como técnica hoje? O aluno deve aprender os princípios mecânicos, o relaxamento e os diferentes tipos de memória: auditiva, muscular e visual. É um mecanismo complexo dentro de uma pessoa, a partir do qual deve-se fazer com que haja uma sinapse, ou seja, que todos esses elementos funcionem harmoniosamente. Costumo trabalhar diretamente os pontos de dificuldade do aluno e lido bastante com o estímulo. Sem isso, não existe afetividade, e sem ela, não há crescimento. Um aluno estimulado rende muito mais. Mas, se o professor tenta impor sua maneira de tocar, ele pode acabar com o aluno.
Qual é a média de tempo ideal do seu curso?
Um aluno costuma ficar dentro de um tempo útil de quatro anos, com aulas semanais de uma hora.
Quais violões você recomendaria aos iniciantes e aos profissionais?
Hoje, no Brasil, temos muitos luthiers. De bons a excepcionais. Cito como de altíssimo nível, em padrões internacionais, o Sérgio Abreu e o Antonio Tessarin. Há também o Shigemitsu Suguiyama, para quem gosta daquele tipo de som. Outros grandes são: o Roberto Gomes e o Diniz, cujos violões são mais em conta. Para um aluno médio, recomendo um de Saraiva ou de João Batista. Em Minas, há o Virgílio. Depende muito do poder aquisitivo do aluno. Para se começar, há violões de fábrica, como o Giannini, ou aqueles importados, de qualidade discutível, porém econômicos.
(Henrique Pinto / Arquivo particular: Shirley Higa)
Quais escolas você recomendaria para quem quer estudar violão clássico?
Há a Escola Municipal de Música, onde eu também leciono e é gratuita. Há a Universidade Livre de Música e alguns bons conservatórios, como o Souza Lima e o Villa-Lobos. Há as oficinas de música da prefeitura, também gratuitas. Para iniciar, é suficiente. Para estudar pra valer, deve-se procurar um bom professor particular, ou uma faculdade.
Em bancas examinadoras para docente de violão em universidades, o que você comentaria sobre o nível dos candidatos a professor de violão universitário?
Varia muito. Posso citar o caso da Universidade de Salvador (UFBA), a mais recente a me convidar como jurado. Quem entra tem de passar por uma seleção rigorosa, pois além de tocar, tem de demonstrar que conhece pedagogia. Não participei da última seleção para a UFMG, mas soube que o nível foi altíssimo.
Em 1989, você gravou um disco com o Violão Câmara Trio. Considerando-se que você começou a carreira em 1967, demorou 22 anos para gravar. Em sua opinião, o mercado de violão é inviável?
Minha opinião é que existe uma quantidade astronômica de estudantes de violão e eles não compram discos de violão. As alternativas para se vender um disco de violão são os concertos, os alunos ou amigos. Esgotadas essas possibilidades, não há mais como. Em minha opinião, um disco é caro e deveria custar menos. Mas há uma grande falta de interesse dos violonistas. Pouquíssimos têm uma boa coleção de violão e o restante grava de quem tem (risos).
OUÇA FAIXAS SELECIONADAS DO DISCO VIOLÃO CÂMARA TRIO (1989)
Em sua opinião, por que o violão está nesse marasmo e os violonistas tão imobilizados?
Por culpa deles mesmos. É um pouco de comodismo e falta de interesse. Geralmente, o violonista não é apaixonado pelo violão em si, mas por ele mesmo tocando. A maioria dos violonistas não vai aos concertos de seus colegas. Só quando se trata de algum artista consagrado.
Qual sua opinião sobre coordenação de concursos de música? Até que ponto um concurso premia a real competência do intérprete?
Essa é uma questão complexa. Quando algum candidato se destaca por sua técnica, por um trabalho minucioso, pela musicalidade e fluência, fica evidente. Mas é muito complicado quando nos deparamos com diferentes formas de se fazer música. John Williams me disse que o seu jeito de tocar era bastante diferente do de Segóvia, seu mestre. “Sou um músico rítmico e toco mais preciso. Segóvia era um músico melódico e preocupava-se com a linha melódica acima de tudo”, dizia ele. Então, se perguntarmos a um júri como um vencedor foi avaliado e eles disserem que foi pela musicalidade, isso não significa nada. Esse conceito é subjetivo. Você diria que o Williams é menos musical que Segóvia? Cada um faz música de acordo com a sua personalidade. Num concurso, é preciso avaliar os candidatos pelo trabalho, pelo preparo, pela precisão, pelo controle e pelo domínio de sua apresentação. E um concurso pode ser arruinado se escolherem a banca errada. Não dá para colocar numa banca uma pessoa muito ortodoxa, sem flexibilidade. E é muito mais complicado no Prêmio Eldorado, em que temos violão, percussão, piano, flauta, etc., e todos os candidatos maravilhosos. Qual é o parâmetro de julgamento deles? Exatamente o que não dá para ser julgado: a musicalidade. Isso é pobre, vago e pequeno. É o imponderável, pois não há referência, a menos que todos os jurados entendam muito de violão, percussão, piano, etc.
Um profissional de violão bem-sucedido como você inclui publicar livros, tocar em público, gravar discos, dar 40 horas de aula por semana, cursos de férias (e não ter férias), coordenar cursos, participar de bancas examinadoras, etc. Por que um violonista não consegue simplesmente viver só de recitais?
É complicado. Para chegar nesse patamar, deve-se, além de ser muito bom, ter uma estrutura de mídia, ganhar todos os concursos que surgirem, incluindo os internacionais. Nosso mercado está saturado de artistas e cada um deve procurar seu próprio caminho. Percebo que há uma deficiência muito séria nas faculdades de música, que não ensinam o aluno a utilizar bem o que aprendeu. Quem toca instrumento de orquestra não terá tantos problemas, mas nós, violonistas, temos de ter uma grande habilidade de auto-promoção. Uma faculdade deveria oferecer cursos de marketing e administração. O aluno deveria sair de um curso sabendo lidar com o lado político da coisa e enxergar a realidade de uma carreira. Geralmente, o artista sabe muito pouco a respeito disso.
Com esse currículo respeitável, você acha que ainda há mais coisas a serem feitas pelo violão no Brasil? No que você poderia contribuir?
Observo que há uma lacuna no ensinar a dar aulas. Quando trabalho um aluno, ele não sabe qual foi o processo de observação que tive com ele. E quando vejo os alunos de pessoas que formei, sinto que ficaram certas lacunas. Portanto, acho que seria uma boa contribuição um curso para ensiná-los a lecionar.
Você se tornou um mito dentro do meio violonístico brasileiro. Esse mito corresponde à verdade?
Isso é novidade para mim. Não me considero mito. Para mim, mito é Sérgio Abreu, que é excepcional na música, no violão e na lutheria e que, com essa grande quantidade de excepcionalidades, continua excepcionalmente humilde, melhorando tudo o que faz.
Como você encara a sobrevivência de um profissional de violão numa época tão desfavorável às artes e à cultura, especialmente num país em crise? Você orienta seus alunos a se defenderem disso?
Se tenho um aluno talentoso, num primeiro estágio eu o ensino a tocar e apresentar-se bem. Depois, eu o faço perceber que ele vai viver disso e que o dinheiro é importante também. Ele vai ter de ser um profissional autônomo e precisa saber dar aulas, fazer uma proposta de recital, escrever uma carta.
Enfim, você conseguiu quebrar aquele antigo conceito do violão pelo violão...
Isso nem se justifica mais. Funcionava na época em que comecei a estudar, pois o violão estava num estágio amadorístico. Violonista era violonista, músico era outra coisa. Era tão dolorido ouvir isso...(risos). Quando ia fazer música de câmara, eu sentia a diferença de ser só violonista e não ter aprendido música o suficiente.
Fale um pouco de seus seminários e das famosas séries de violão no MASP.
Esses cursos nasceram na época em que eu trabalhava no Conservatório do Brooklin Paulista. Comecei a dar os primeiros passos nessa direção com o apoio de Sigrido Leventhal, que era o diretor. Convidamos Carlevaro para estrear este evento, depois Eduardo Fernández. A repercussão foi tão grande, que atraiu mais de 80 estudantes, incluindo gente do México. Mais tarde, começamos a elaborar seminários com professores locais, como Paulo Porto Alegre, os irmãos Gloeden, etc. Depois, idealizei uma série de concertos, a Mostra de Violão. Tudo isso acabou se fundindo numa coisa só. Para organizar esses eventos, nunca fui atrás de patrocínio. Sempre fiz espontaneamente, sem ter lucro. Quando convido um professor, os alunos pagam uma taxa e eu faço uma pequena complementação. É uma necessidade que sinto em reunir os alunos em torno desse encontro.
(Henrique Pinto / Arquivo particular: Shirley Higa)
O Sr. poderia descrever, em poucas palavras, seus conceitos a respeito dos seguintes violonistas:
Andrés Segovia: O maior violonista do século.
John Williams: Um grande violonista carismático.
Julian Bream: Talvez o maior músico violonista do século.
Duo Abreu: O maior duo do século. Sem dúvida.
Duo Assad: Também.
Monina Távora: Uma professora deslumbrante.
Eliot Fisk: Poderia administrar melhor sua técnica.
Manuel Barrueco: Grava muito bem. Ao vivo, um pouco monótono.
David Russell: Apaixonante. Ao vivo, maravilhoso.
Paco de Lucia: Grande músico. Muita energia e criatividade. Talvez o maior flamenco do século.
*Flavio Apro é professor de violão na UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ e pesquisador visitante na CALIFORNIA STATE UNIVERSITY (EUA) e SZEGED UNIVERSITY (Hungria). Doutor pela USP, Flavio lançou CDs para o prestigiado selo Brilliant Classics na Holanda, tais como "Flavio Apro Plays Napoleon Coste", “Nocturne” e “The Brazilian Guitar”, assim como “O Violão Brasileiro”. Sua pesquisa acadêmica resultou no lançamento do CD “Francisco Mignone - Doce Estudios Para Guitarra”, no México. Apresenta-se regularmente nas principais salas de concerto brasileiras, nas Américas, Europa e Ásia.